Estará a sua logística ultrapassada?

Estima-se que o e-commerce atingirá os 5 biliões de dólares em 2021. Em Portugal verifica-se um crescimento em consonância. Neste artigo, da autoria de Filipe Carvalho, saiba quais são os três indicadores de que a sua logística poderá estar ultrapassada.

ET 104 - Tecnologias de informação

Cerca de 3 milhões compram online por ano despendendo pouco mais de 1000€ em média durante este período. As viagens compradas online levam grande parte deste valor, mas também o vestuário e a tecnologia. Por fim, e apesar de não ter ainda a principal preferência dos consumidores, o retalho verifica uma adopção crescente por parte dos portugueses que preferem cada vez mais a comodidade de verem as suas mercearias chegarem a casa em vez de se deslocarem a um estabelecimento comercial. Noutros países europeus o e-commerce no retalho tem bastante mais expressão. Apesar do perfil dos consumidores ser algo diferente – por exemplo, por viverem em espaços urbanos mais densos, sem possibilidade ou necessidade de possuírem carro próprio - será de esperar que as evoluções que temos vindo a verificar lá fora acabem por acontecer também a nível nacional.

Em particular, o e-commerce associado a um processo logístico de entrega em casa tem vindo a mudar em função da própria evolução da tecnologia e da exigência por melhores serviços (intervalos de tempo de entrega de uma hora, por exemplo) aos menores custos. Isso implica maior eficiência logística e a alteração de paradigmas operacionais que têm sido assumidos como as melhores práticas desde sempre. Vejamos 3 exemplos.

1 - O consumidor só pode escolher um slot de entrega

É certo que o consumidor não quer ter de estar em casa mais tempo do que o estritamente necessário para receber a encomenda. Mas por vezes a disponibilidade é maior do que a que os slots disponíveis para escolha lhe apresentam. Por exemplo, um site pode dar-me a escolher uma hora entre as 9h e as 22h mas eu até devo estar em casa o dia todo. Vou escolher um dos slots da manhã (por exemplo, entre as 9h e as 10h) e é apenas essa preferência que o vendedor online saberá de mim porque me obrigou a escolher apenas um slot.

Por outro lado, o meu vizinho do lado, no mesmo prédio, pode estar a fazer uma encomenda para o mesmo dia que eu. Mas como tem menos disponibilidade durante o dia, reserva um slot entre as 18h e as 19h. Mais uma vez, o vendedor online fica apenas com a visibilidade de que a juntar à (minha) encomenda para as 9h, tem de regressar ao meu prédio às 18h para servir o meu vizinho do lado. E eis quando o vizinho de cima, que está em casa durante a manhã toda, faz a sua encomenda. Para as 12h... Com certeza que todos os consumidores pretendem ser servidos em função de slots o mais estritos possível. Ninguém gosta de aguardar mais do que o necessário. Mas isso pode ser extremamente caro para a logística.

A gestão de slots mais eficiente não obriga a que o consumidor defina «o» slot que pretende, mas que indique «todos» os slots em que pode ser visitado. Isto permite que o vendedor online possa recolher as preferências de todos os seus clientes e planificar as suas rotas de forma optimizada (seguramente sem ir 3 vezes ao mesmo prédio ao longo do dia). Depois deste planeamento de rotas ficar definido, o consumidor deve ser avisado da hora seleccionada para a entrega (por exemplo por SMS), de entre todas as que compõem a sua disponibilidade. E tal aviso deve sair algumas horas apenas depois de ter colocado a encomenda, pelo que lhe será indiferente saber a hora prevista de chegada logo na altura da encomenda ou uns momentos depois. Na prática, qualquer hora seleccionada estará sempre restrita à indicação inicial de disponibilidade do consumidor. Esta «pequena» alteração de paradigma permite que a logística planeie rotas muito mais eficientemente, consiga fazer mais entregas por dia e ainda reduza os custos globais da operação, tornando-se cumulativamente mais competitiva.

ET 104 - E-commerce

2 - A capacidade de encomendas por slot é limitada a um número fixo.

Uma forma simplista de gerir a aceitação de encomendas é definir um limite máximo por cada slot de disponibilidade. Esta abordagem procura garantir que será possível planificar rotas que consigam cumprir com todos esses compromissos realizados com os clientes na altura das suas encomendas.

Por exemplo, se uma frota com 10 viaturas disponíveis pretende oferecer um serviço com slots de 1 hora, então provavelmente irá permitir receber até 10 encomendas por cada slot horário. Isto pressupõe haver tempo suficiente para planificar uma deslocação entre quaisquer dois locais em menos de 1 hora. No entanto, a minha encomenda acompanhada pelas dos meus vizinhos é sufi ciente para ilustrar as vulnerabilidades da abordagem enunciada. Se um carro já vai entregar a um local então qual é o custo marginal de adicionar mais serviços nesse local? Muito baixo. Aliás, tão baixo que faz pouco ou nenhum sentido bloquear as encomendas em função de um número estimado e predefinido de capacidade.

O processo mais eficiente consiste em considerar a morada de entrega do consumidor para simular quando (e se) é possível servi-lo, independentemente do número de encomendas para a mesma hora. Isto implica que esteja subjacente um plano de rotas optimizado em permanência, sendo potencialmente ajustado em função de cada encomenda que vá surgindo ao longo do tempo. Somente desta forma é possível estimar com precisão o custo marginal de servir cada cliente específico e mesmo de decidir se é possível, ou não, fazê-lo em função dos compromissos assumidos com todos os outros clientes que já confirmaram as suas encomendas.

Do ponto de vista operacional, esta é a melhor forma de gerir dinamicamente a capacidade da frota disponível e assumir com rigor quais as entregas que é possível realizar, e em que slots horários. Assim, maximizam-se as entregas realizadas, com os mesmos recursos e baixando o custo marginal.

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3 - Cada motorista serve a sua zona

Dividir para conquistar. Esta máxima tem sido seguida sempre que nos deparamos com um problema complexo para resolver. Temos tendência para decompô-lo num conjunto de problemas de menor dimensão que sejam resolúveis mais simplesmente. Quando olhamos para um mapa de uma região a cobrir com uma frota operacional de entregas temos a tendência natural para o dividir em várias zonas complementares. A cada zona atribuímos depois uma viatura da frota disponível. Com o tempo, os motoristas habituam-se à zona e vão desempenhando de forma cada vez mais eficiente as entregas. Mas esta abordagem implica que nas regiões limítrofes seja imposta uma separação demasiado rígida. Por exemplo, se um motorista anda no centro da sua zona e tem um serviço apenas para realizar numa das extremidades desta é obrigado a fazer um desvio considerável durante a sua rota. No entanto, o motorista da zona adjacente poderia estar mais próximo dessa extremidade na sua rota habitual e seria mais eficiente se fosse este a realizar tal serviço.

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Para isso teria de se intrometer na zona do colega, mesmo que por alguns metros, mas tal nem sequer é equacionado porque estão definidas barreiras estritas na região a separar as áreas de actuação de cada um. Ora, isto pode acarretar custos significativos e facilmente evitáveis se o planeamento de rotas fosse dinâmico e pudesse decidir sem ser forçado a critérios artificiais como o da divisão dos territórios.

Quando resolvemos um problema grande manualmente precisamos de aplicar simplificações, mas com o suporte da tecnologia disponível tais simplificações devem ser colocadas em causa porque acabam por ser contraproducentes para a optimização dos custos e a qualidade do serviço.

Os exemplos apresentados são apenas 3 dos vários paradigmas que têm vindo a ser alterados nas melhores cadeias logísticas em e-commerce, que vão desde o conceito de omnicanal até mesmo à optimização dos custos dos slots para serem transformados em fonte de receita e não em fonte de custo, entre muitos outros.

 

Artigo originalmente publicado na edição n.º 104 da Revista Eurotransporte

 

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