É na construção de relações sólidas que nos diferenciamos
Sara Vieira, chefe de vendas da IVECO Trucks (Região Norte)
Sara Vieira, natural de Espinho, tem 33 anos de idade e lidera, desde o final do ano passado, a equipa de vendas da IVECO Trucks para a Região Norte. Com formação na área do Marketing, Publicidade e Relações Públicas, com antecedentes profissionais na área das energias e no negócio do transporte de mercadorias, carrega já suficiente know-how para se sentir à vontade num meio particularmente difícil, onde um aperto de mão sela o compromisso de uma parceria, de uma relação duradoura. Ao fim e ao cabo, o objetivo final é satisfazer as necessidades do cliente. Diz não se sentir discriminada por ser mulher, quebrando algum estereótipo que ainda subsista, e perfilha a doutrina da “arte pessoal” no tratamento negocial.
EUROTRANSPORTE - O meio comercial dos pesados já lhe era familiar desde 2018, e anteriores funções na área comercial dos combustíveis alternativos - com os pesados na Scania Portugal e através da Dourogás - proporcionaram-lhe piso sólido para conduzir relações comerciais no ramo?
SARA VIEIRA - O meio comercial de pesados, para mim, nasceu em 2018, quando ingressei noutra marca (Scania) como Business Development. Depois dessa experiência, tive oportunidade de entrar na área comercial de combustíveis alternativos, como gás natural e biometano, que me permitiu estabelecer relações de proximidade com várias empresas de transporte de pesados. Foi uma construção contínua durante esses anos, uma procura constante para a criação de relações que me permitiram adquirir know-how dentro do ramo.
Poder-se-á dizer que é um meio diferente de tudo o resto, não só pelo produto em si, mas pela especificidade que o rodeia? Ou tem dificuldades que não estão à vista?
Acredito que todas as áreas económicas têm as suas especificidades e características diferenciadoras. Mas um produto não deixa de ser um produto e um cliente não deixa de ser um cliente. O conhecimento aprofundado do nosso produto é essencial para encontrar as respostas que os nossos clientes procuram para o seu negócio.
No entanto, esta área distingue-se por diversas razões. Além da complexidade técnica do produto, é necessário um envolvimento contínuo com o mercado para compreender suas necessidades em constante evolução. O foco principal transcende a simples venda, centrando-se no relacionamento e na confiança estabelecida com o mercado. Portanto, a maior dificuldade está na aquisição do conhecimento de todas as variáveis da mobilidade pesada.
Ou é uma atividade como qualquer outra, desde que avaliada do ponto de vista profissional...
Acredito que o fundamento comercial seja igual em todas as áreas de negócio: os clientes têm necessidades e quem for melhor a compreender e responder a essas necessidades será quem o conquista e fideliza. Podemos dizer que esta atividade se distingue pelo forte compromisso que promove em cada um de nós, pelas sinergias criadas e pela construção de relacionamentos a longo prazo. A base de clientes é constante e é na construção de uma relação sólida que nos diferenciamos. Esta área é viciante, e quem está envolvido nela com certeza concordará comigo.
Nunca sentiu diferente tratamento negocial pelo simples facto de ser mulher?
Este sector é tradicionalmente dominado por homens, mas não vejo que o género seja de alguma forma limitador nem sinto qualquer discriminação negativa pelo facto de ser mulher. Existem neste mercado já várias mulheres, como motoristas, gestoras de empresas e, como exemplo, a diretora geral da Iveco, Sandra Resende. Posso ser a primeira mulher a ocupar o cargo de chefe de vendas, mas a nossa presença já é significativa neste setor. Relativamente ao tratamento negocial, a doutrina diz que é uma arte pessoal e, sendo assim, todas as características das partes em negociação têm alguma influência, mesmo que ínfima. Dito isto, haverá situações em que eu possa ter sentido tratamento negocial diferente, como acredito que, outros, por outras razões, o tenham sentido também.
Ao fim e ao cabo, a líder da empresa também é mulher... Esse facto teve alguma influência?
Existe sempre alguma influência, ter uma líder como a Sandra Resende é positivo para a minha carreira e para a IVECO. A liderança não está no género, apesar de acreditar que a liderança feminina poderá promover um ambiente de trabalho mais inclusivo e diversificado. Desta forma, olho para a IVECO como uma empresa inovadora e vanguardista que aposta no talento e na meritocracia. A líder da IVECO chegou ao lugar pela sua capacidade e, no meu caso, não me parece que ser mulher me fosse uma mais-valia ou menos-valia para ser a escolhida para esta posição. Acredito que, no fim de contas, a liderança me avaliará pelo meu trabalho e pelos meus resultados, e serei reconhecida pelo meu mérito.
Celebrar um negócio com esta especificidade: é mais fácil com homens ou mulheres?
Mais uma vez, o género tem menos influencia na celebração de um negócio do que qualquer outro fator. Este mercado é tão dinâmico, dependente do contexto e da conjuntura, que se torna mínima a influencia do género na negociação.
Digo antes que celebrar um negócio é a parte fácil, seja com homens ou mulheres. O mais difícil será sempre lidar com as oportunidades de negócio que não se concretizam, e, nesse aspeto, será sempre mais fácil com boas pessoas, sejam elas homens ou mulheres.
Há poucas mulheres profissionais de camionagem (pelo menos em Portugal). Consegue transmitir-lhes algo como incentivo?
Esta é uma área em constante desenvolvimento, repleta de oportunidades, e acredito que exista um espaço cada vez maior para as mulheres. Parabenizo aquelas que seguiram a sua trajetória profissional sem se deixarem limitar por estereótipos, e estou certa de que essa determinação permitirá que se tornem profissionais de excelência.
Como foram, comercialmente, os tempos de pandemia?
Ainda não estava na IVECO durante a pandemia, mais ainda assim estava no ramo da mobilidade pesada em funções da área comercial. Foi um período extremamente difícil para todos. No entanto, procurei sempre responder aos desafios da melhor forma, com o objetivo de cumprir o que já mencionei anteriormente: resolver os problemas dos clientes é a chave para conquistá-los e fidelizá-los. Brincando com assuntos sérios, na altura não faltaram problemas para resolver. Foi certamente desafiante.
Onde está a linha que conduz a um bom negócio entre as duas partes?
Linhas existem muitas e a definição de bom negócio é muitas vezes utópica. Basta vermos que um mesmo negócio pode ser fenomenal para uma parte e um mal menor para outra. Acredito que uma negociação é mesmo o satisfazer de necessidades dos clientes tendo em conta os produtos e serviços que temos para oferecer e, sempre que se chega a bom porto, é onde está a linha. Para mim a linha claramente reside no equilíbrio entre as partes e existem princípios que prezo para atingir essa tal ambicionada linha mais vezes. A honestidade, transparência e o tempo. O tempo é o nosso maior ativo, e na IVECO estamos dispostos a investir do nosso tempo para resolver as necessidades dos nossos clientes. Esta é uma das características que mais valorizo na minha equipa, que é 100% dedicada ao negócio do cliente. Estamos comprometidos não só na venda, mas com todo o processo. Na celebração de um negócio, no aperto de mão, levamos connosco o compromisso de uma parceria, de uma relação duradoura. Em abstrato, o bom negócio será sempre aquele que cria valor para ambas as partes, mas isso é romantizar uma arte que está repleta de cedências e concessões.
A região Norte tem alguma particularidade diferente de outros locais para a realização de um bom acordo?
Todas as pessoas têm as suas particularidades. No Norte, no Sul ou no Centro, os bons acordos são feitos por pessoas integras e acredito que essas qualidades estejam presentes em qualquer parte do país.
Que entraves/dificuldades (como fatores externos, ou de contexto económico nacional) tem ouvido dos seus interlocutores?
Existem sempre dificuldades, principalmente para quem está próximo dos clientes, que é o caso da IVECO. Tentamos sempre nos adaptar a todos os desafios e estamos constantemente ao lado dos nossos clientes para ultrapassá-los com sucesso.
O cenário macroeconómico é muito volátil e temos que estar sempre de alerta para corresponder da melhor maneira. É certo que a transição energética possa ser o maior desafio da próxima década, desenvolvimento tecnológico, muita atividade legislativa, muitas metas a alcançar por, basicamente, todas as empresas. No entanto, na IVECO já estamos preparados para apoiar os nossos clientes a esse nível.
O diesel ainda reina! Até quando?
Penso que o diesel vai fazer sempre parte da nossa realidade, reinar já não sei se será assim. Acho que todos os combustíveis terão um papel muito importante.
Quão difícil é fechar um negócio, atualmente, para um produto não-diesel, tenha ele as características que tiver (elétrico, gás, bio, hidrogénio)?
Se olharmos para os números, que são factos, é muito difícil. A venda de tecnologias alternativas ao diesel é, neste momento, salvo raras exceções, exclusiva a empresas que trabalham com insígnias que obrigam os transportadores a descarbonizar. A minha perceção é que este tipo de empresas irá aumentar exponencialmente e, por isso, teremos de estar preparados para ajudar os transportadores a descarbonizar.
Tem notado uma diferente perceção dos empresários sobre as questões da descarbonização?
Sem dúvida. Cada vez mais são os que procuram energias alternativas que possam promover a descarbonização. A realidade é que existe diferença no custo, seja capex seja opex, e então a motivação terá que estar associada a uma necessidade. Esta aparecerá com as novas metas e legislações.
Tem notado mais curiosidade sobre o assunto, questões que ainda não tinha ouvido, ou tudo se resume ao TCO e à escassez dos pontos elétricos de abastecimento?
Muita coisa vai mudar nos próximos tempos com o desenvolvimento das tecnologias descarbonizadas. Na IVECO temos produtos capazes de contribuir para que esse desenvolvimento seja ainda mais rápido, com viaturas preparadas para o biometano somos capazes de descarbonizar totalmente já hoje. Esta opção em relação ao TCO tem uma diferença residual em relação ao Diesel. Quanto à eletrificação da frota pesada de mercadorias, temos alguns desafios que estão para além dos próprios camiões, como a capacidade da rede elétrica, mas acredito no futuro desta tecnologia também. Como já referi anteriormente, todos os combustíveis terão um papel muito importante e cada um deles terá o seu espaço para contribuir na descarbonização.
Carlos Branco
In Eurotransporte #141