---

«A aposta na ferrovia é para manter»

12 outubro 2021

Entrevista a Carlos Fernandes, Vice-presidente da Infraestruturas de Portugal.

Com um investimento superior a 2 mil milhões de euros, o Projecto Ferrovia2020 encontra-se numa fase decisiva com mais de 80% do investimento em fase de obra ou já concluído. Para Carlos Fernandes, vice-presidente da Infraestruturas de Portugal, a aposta na ferrovia é para manter e a reabertura à circulação do troço da Linha da Beira Baixa entre Covilhã e Guarda, concretizado no passado mês de Maio, é um dos projectos emblemáticos do Programa.

Em entrevista à Eurotransporte, este responsável, licenciado em Engenharia Civil e mestrado em Transportes, não só destacou o facto da reabertura da Linha da Beira Baixa, como explicou a importância do projecto Ferrovia2020 para o desenvolvimento do País, através do transporte ferroviário como um dos mais seguros e sustentáveis, para além de ser “amigo do ambiente”.

Na época, o respectivo governo, resolveu fechar a Linha da Beira Baixa e outras, muito devido às dificuldades financeiras que Portugal atravessava. Hoje existe uma aposta forte do actual executivo na ferrovia. A reabertura da Linha da Beira Baixa faz parte dessa aposta?
É evidente a aposta do país na modernização e expansão da Rede Ferroviária Nacional. Uma aposta alicerçada nos incentivos da União Europeia na promoção do uso do transporte ferroviário como um modo de mobilidade segura e sustentável e é para manter. Estes são, aliás, os princípios que levaram a UE a definir 2021 como o ‘Ano Europeu do Transporte Ferroviário’. Em 2016, quando apresentámos o plano Ferrovia2020, foi exactamente com o objectivo de fomentar a utilização do transporte ferroviário, de mercadorias e de passageiros, melhorando a eficiência, capacidade e segurança das infraestruturas ferroviárias nacionais.

Num investimento superior a 2 mil milhões de euros, o Ferrovia2020 encontra-se agora numa fase decisiva com mais de 80% do investimento em fase de obra ou já concluído. Um dos projectos emblemáticos do Ferrovia2020 é o de reabertura à circulação do troço da Linha da Beira Baixa entre Covilhã e Guarda, concretizado a 2 de Maio com o início da circulação ferroviária. A abertura à exploração deste troço, que estava encerrado há mais de uma década, assegura não só a ligação directa entre duas das mais importantes cidades na região das Beiras e Serra da Estrela, mas reveste-se também de grande importância para a Rede Ferroviária Nacional (RFN). Com a abertura do troço Covilhã-Guarda, é assegurada a circulação de comboios com tracção eléctrica em toda a extensão da Linha da Beira Baixa, cerca de 240 quilómetros, constituindo-se como um trajecto alternativo e complementar à Linha da Beira Alta.

Estação_do_Entroncamento

Mas teve de se efectuar melhoramentos na Linha?
Sim. Recorde-se que no âmbito deste projecto foi construída, na zona da Guarda, uma nova via de ligação directa entre a Linha da Beira Baixa e a Linha da Beira Alta, denominada de Concordância das Beiras. A concretização destes investimentos assegura uma importante melhoria da capacidade da RFN como elemento dinamizador do transporte ferroviário nas ligações inter-regionais e na ligação a Espanha.

Qual a importância do Corredor Internacional Norte, que contempla a Linha da Beira Baixa, e não só, para Portugal?
Os projectos inscritos no Ferrovia2020 previstos executar no Corredor Internacional Norte compreendem investimentos na Linha de Leixões, Beira Alta e na da Beira Baixa. Estes projectos visam melhorar a ligação ferroviária do Norte e Centro de Portugal com a Europa, promovendo um transporte ferroviário de mercadorias mais eficiente e competitivo, permitindo a articulação entre os portos de Leixões e Aveiro e a fronteira de Vilar Formoso. A modernização da Linha da Beira Alta permitirá mais do que duplicar a sua capacidade, dos actuais 14 comboios por dia, com 500m de extensão, para cerca de 25 comboios diários de 750m. O aumento do comprimento máximo dos comboios de mercadorias conduzirá à redução do custo do transporte, estimando-se por exemplo uma redução de cerca de 30% no transporte entre o porto de Leixões e a fronteira de Vilar Formoso.

O aumento de circulação de comboios prevê-se que venha a contribuir para um maior desenvolvimento da região. É mesmo assim?
A abertura à circulação deste troço representa não só a criação de uma ligação ferroviária directa entre duas importantes cidades no interior do País, mas também, e talvez principalmente, a criação de uma linha complementar e alternativa à Linha da Beira Alta, duplicando as condições de acesso à fronteira em Vilar Formoso. A Rede Ferroviária Nacional oferece agora maior capacidade operacional, disponibilidade e fiabilidade ao serviço das populações e das empresas, tanto nas ligações regionais como na ligação com Espanha e o resto da Europa.

A reabertura da linha teve custos. Qual foi o investimento para reabrir e modernizar a Linha?
O projecto de modernização envolveu um investimento total de 77,12 milhões de euros, sendo comparticipado por fundos da União Europeia em 60,57 milhões de euros.

Actualmente a Linha apresenta melhorias ao nível das comunicações e sinalização electrónica. Foi difícil a concretização?
A Linha está agora dotada com os mais modernos sistemas de sinalização e de comunicações ferroviária, que garantem uma ampla capacidade operacional e de segurança na circulação. Foram instalados equipamentos de sinalização electrónica e telecomunicações (GSM-R), e implementado o sistema de controlo de velocidade.

1441_LBB_2021_00004

No que diz respeito às estruturas, como passagens de nível, estações e apeadeiros, que dificuldades surgiram?
No âmbito da empreitada foram desenvolvidas diversas intervenções nos edifícios das Estações e Apeadeiros, tendo como principais objectivos as melhorias das condições de conforto dos utilizadores destes espaços, a sua mobilidade e o acesso dos passageiros ao transporte ferroviário. Importa salientar que este era um troço ferroviário encerrado há mais de uma década. Foi por isso necessário realizar intervenções profundas de modo a garantir o nível de serviço adequado às necessidades dos utilizadores que agora voltam a dispor do transporte ferroviário. A empreitada envolveu intervenções mais profundas na Estação de Belmonte e nos Apeadeiros de Caria, Maçainhas, Benespera e Barracão/Sabugal.

Tiveram de recuperar e criar novas plataformas, certo?
Os trabalhos realizados compreenderam, entre outros, a recuperação dos edifícios, a construção de novas plataformas e a requalificação das zonas envolventes, como é exemplo a beneficiação do Largo da Estação de Belmonte ao nível do estacionamento automóvel. Ao nível da infraestrutura ferroviária, a Estação de Belmonte está agora capacitada para o estacionamento de comboios com 600 metros de comprimento, assegurando o aumento da capacidade da linha quanto ao número de comboios e ao volume de carga transportada, o que se traduz numa importante redução dos encargos de transporte.
Ao nível das Passagens de Nível foram automatizadas 18 Passagens de Nível (PN) e suprimida a PN situada ao quilómetro 206,960 no concelho da Guarda. Como alternativa neste local de atravessamento, foi construída uma passagem inferior a cerca de 250 metros do local onde anteriormente se situava a PN.

E relativamente à Concordância das Beiras foi difícil a construção?
Importa também destacar a construção da denominada Concordância das Beiras, uma ligação ferroviária directa entre a Linha da Beira Alta e a Linha da Beira Baixa, em via única electrificada, com 1.500 metros de extensão, que incluiu a execução de uma nova ponte ferroviária sobre o rio Diz, com uma extensão de 237,8 metros. Esta nova ligação permitirá que, no futuro, comboios oriundos da Linha da Beira Baixa se possam dirigir directamente a Espanha. De grande importância também foi o trabalho de Reabilitação integral de 6 Pontes Ferroviárias existentes ao longo deste troço. Foram concretizados trabalhos de reabilitação e reforço de 6 pontes ferroviárias - Ponte da Carpinteira; Ponte do Corge; Ponte do Zêzere II; Ponte de Maçainhas; Ponte dos Gogos; Ponte Penha da Barroca - todas com mais de um século de existência.

Que benefícios ambientais a Linha vem proporcionar?
A abertura à circulação deste troço vem garantir diversos benefícios a nível ambiental. Estes benefícios serão alcançados não só pela utilização de comboios de tracção eléctrica no serviço de passageiros ao invés das antigas locomotivas com motores Diesel. Ao constituir-se como um meio de transporte mais atractivo e eficiente, é expectável que o transporte ferroviário venha, progressivamente, a cativar um cada vez maior número de utilizadores, preferindo o uso do transporte colectivo ao transporte individual.

 


Tags

Recomendamos Também

Revista
Assinaturas
Faça uma assinatura da revista EUROTRANSPORTE. Não perca nenhuma edição, e receba-a comodamente na usa casa ou no seu emprego.